quinta-feira, 24 de agosto de 2017

aqui, agora

Ansiosa por natureza, unhas roídas e cutículas feridas retratavam a pressa. Tinha dificuldade em engolir a comida, pois já pensava no próximo gesto calculado com seu olhar de altivez.

Os sonhos tão significativos na terapia Freudiana, agora não tinham mais sentido. Há anos buscava alguma CID para pertencer. Decidiu viver o aqui e o agora – não havia motivos para ruminar tanto, essa coisa do silêncio no divã causava incômodo. Desde estão, os sonhos transformaram-se em meros devaneios do acaso.

Decidia muitas coisas chapada. Sua maior frustração era sentir o cheiro e gosto da erva a caminho do trabalho – seu passatempo preferido era fumar erva e escrever. Alguns dias de glória tirava a roupa depois da fumaça virar neblina e dançava como se alguém a visse.

Uma garrafa de vinho nunca é má ideia, aliás, melhor casamento sem possibilidades de divórcio. Amor eterno.

Beberia todos os dias, mas com cautela lembrava das palavras do Caboclo:
-Nem tudo o que desejamos é o que necessitamos.

As palavras significavam muito, talvez mais que os sonhos.

Havia tomado a decisão de sincronizar seus atos com suas palavras.
Abandonara a ideia de sincronizar sexo com amor.

Adormecia pensando em seus beijos. Mentira. Desde a primeira vez que conversaram tinha curiosidade por saber qual expressão presenteava seus traços ao despertar. Romântica alucinógena.
Odiava seus vizinhos. O canto artificial dos pássaros fodia sua cabeça, não conseguia entender a necessidade de prender animais.

Decidida a não brigar, apenas por grandes feitos. Ignorava os gritos, afinal no capitalismo é preciso preservar a integridade moral.
À espera do ônibus sentiu o asfalto respirar. Essa impressão funcionava como alavanca: confundia realidade com fantasia. Mesclava situações com vontades.
Essa noite sonhou que o amava.
Ele visitou seus sonhos porque antes do sono chegar, pensava em seus lábios.
O sonho causou explosões.
A primeira explodia o controle de seus sentimentos.
A segunda era uma espécie de um novo conceito de amor – sabia que o amava, mas o tempo era escasso a ambos. Estava aprendendo a dosar a lentidão veloz.
A terceira e última pode perceber que seu sonho mesclava a realidade, pois essa sensação já foi criada, esse sentimento tombado e seu coração sempre assaltado em chamas descansava de sua loucura. Era um aprendizado, questionar-se sobre o que é amar e o que é o amor.
Resignificando pensava no poeta:
O amor é um pássaro de livre pouso.

A felicidade são momentos dosados no aqui e no agora.  

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