quarta-feira, 3 de abril de 2024

Convivendo com a Esclerose Múltipla

É assustador conviver com a Esclerose Múltipla. Todos os dias, tento esquecer que tenho uma doença sem cura, mas ela sempre manda lembranças. Dormir 8 horas seguidas com indutores do sono e acordar sentindo que levei uma surra nos sonhos. A vergonha quando durmo e o corpo, em espasmos involuntários, me transforma em uma pessoa assustadora.

Então começo a pesquisar e descubro que a pior coisa para um recém-diagnosticado é ler tudo o que a doença pode causar, assim como a bula dos remédios. Passo a me convencer, de tantas vezes ouvir as “verdades absolutas” de pessoas que acreditam saber mais do que eu, que convivo com a doença todos os dias, que afinal, é só tomar o remédio e seguir a vida.

Lidando com o tratamento

Todos os meses, vou ao Centro de Infusões. Sou grata pelo espaço, pelos funcionários, pela medicação que chega sempre sem atraso e pela médica atenciosa que escuta meus relatos sobre os dias com a EM.

Vivo prestando atenção em todos os sinais do meu corpo, pois preciso relatar qualquer alteração, já que faço uso de um imunossupressor com muitos riscos e reações.

A cada 28 dias, alinhada com minha menstruação, chega o dia da infusão. Sinto ansiedade e culpa. Culpa por não estar acostumada a tomar a infusão que salva minha vida, que milagrosamente cria portões nos meus vasos sanguíneos e retarda a doença. As estatísticas são boas, os pacientes se sentem melhor, mas nenhum desses remédios tem a proposta de melhorar a fadiga crônica.

Os desafios da doença

“Ah, você deve fazer exercícios e se não faz é aí que tá o erro”, dizem alguns. Mas como vou fazer exercícios se estou fadigada?

“Você deve seguir uma dieta mais saudável”, dizem outros. Mas como vou fazer isso se tenho um trabalho com escala 6x1 e apenas 15 minutos de intervalo para comer, ir ao banheiro e fazer tudo o mais?

“Você deve procurar tratamento multidisciplinar”, sugerem mais alguns. Mas como vou pagar por fisioterapia, RPG, pilates, yoga, academia, hidroginástica, psicólogo, psiquiatra, nutricionista, ginecologista, urologista e infectologista?

E a cada 3 meses, o Ministério da Saúde e meus médicos precisam da minha creatina e da receita médica para que o tratamento continue custando um monte de dinheiro para o governo.

E claro que para uma pessoa ansiosa como eu, logo penso que o SUS pode acabar e que a morte vem junto. Os pensamentos catastróficos e o autoconsolo: “Graças a Deus que existe tratamento!”.

Ser imunossuprimida

A gente nunca sabe o que é ser imunossuprimida até se tornar uma. Tenho que me resguardar, cuidar da minha saúde de verdade, não só para postar no Instagram ou para ficar com a bunda dura — é necessidade.

O calor me deixa louca. É difícil enfrentar multidões e luzes com o corpo superaquecido. É me sentir patética por tomar uma cerveja sem álcool no rolê onde visivelmente as pessoas estão “altas”, do jeito que sempre gostei de ficar.

Vivendo com a EM

Sempre vivi intensamente, todas as minhas experiências. Sempre me senti inadequada para a sociedade: muito falante, vivia caindo, me mijando, criando suposições mirabolantes e planos imaginários.

Será que também deveria viver uma doença com tanta intensidade?

Nenhum comentário: