Há muito tempo os abraços eram
habituados ao vazio do cotidiano, como a poeira da sala era o valor do abraço.
O olhar perdido e distante somado a frieza das mãos tão usadas para outras
atividades não encontravam utilidade para diminuir a distância dos nossos
corpos. Resisti porque fui criada pra suportar, mesmo não gostando,
me obriguei a aceitar.
Aceitar o descaso e retribuir com um sorriso, aceitar o
que não gosto com uma bebida, por isso sempre traguei a desordem.
Eu amei e fui amada, mas hoje meu
sentimento de resistência foi direcionando para outro lado.
De caminhos árduos e ruas
esburacadas, corredores brancos e estradas verde esmeralda parei no tempo pra
re significar quem eu sou através de estereótipos estéticos enxerguei além da
matéria.
A gentileza me foi ofertada da mesma maneira que foi retirada, ou eu
que não soube aproveitar.
Reencontrei desejos adormecidos,
vontades suprimidas e anseios destruídos. Tudo começou por acaso, como escreve Kundera – no meu caso foram necessários oito acasos pra poder perceber.
O primeiro
acaso foi o sonho, o segundo acaso a anunciação dele, o terceiro a retribuição,
o quarto os olhares, o quinto a confirmação, o sétimo uma tarde de domingo
despretensiosa e o oitavo a linha amarela do metrô.
Dolorosa passagem assim como a má
colocação das palavras, eu sofri por acreditar que a solução dos meus problemas
estava em uma pessoa, felizmente a sinceridade foi necessária e eu só pude
entender depois.
Voltei a habitual melancolia. Aqueles
dias não me pertenciam mais, o afeto não era mais parte da casa comprida – o sono
e a insegurança ocuparam as frestas de luz preenchidas com fumaça.
Meu sono foi furtado pela obsessão.
Meu corpo invadido pela necessidade patriarcal de não perder.
Agora estou parada naquela janela
observando os dias escorrendo pela ausência do respeito.
Afinal, onze anos perdendo a
individualidade requer um caminho árduo para o reencontro.