quarta-feira, 1 de março de 2017

hoje parece segunda

Há muito tempo os abraços eram habituados ao vazio do cotidiano, como a poeira da sala era o valor do abraço. O olhar perdido e distante somado a frieza das mãos tão usadas para outras atividades não encontravam utilidade para diminuir a distância dos nossos corpos. Resisti porque fui criada pra suportar, mesmo não gostando, me obriguei a aceitar. 
Aceitar o descaso e retribuir com um sorriso, aceitar o que não gosto com uma bebida, por isso sempre traguei a desordem.

Eu amei e fui amada, mas hoje meu sentimento de resistência foi direcionando para outro lado.

De caminhos árduos e ruas esburacadas, corredores brancos e estradas verde esmeralda parei no tempo pra re significar quem eu sou através de estereótipos estéticos enxerguei além da matéria. 
A gentileza me foi ofertada da mesma maneira que foi retirada, ou eu que não soube aproveitar.

Reencontrei desejos adormecidos, vontades suprimidas e anseios destruídos. Tudo começou por acaso, como escreve Kundera – no meu caso foram necessários oito acasos pra poder perceber. 

O primeiro acaso foi o sonho, o segundo acaso a anunciação dele, o terceiro a retribuição, o quarto os olhares, o quinto a confirmação, o sétimo uma tarde de domingo despretensiosa e o oitavo a linha amarela do metrô.

Dolorosa passagem assim como a má colocação das palavras, eu sofri por acreditar que a solução dos meus problemas estava em uma pessoa, felizmente a sinceridade foi necessária e eu só pude entender depois.

Voltei a habitual melancolia. Aqueles dias não me pertenciam mais, o afeto não era mais parte da casa comprida – o sono e a insegurança ocuparam as frestas de luz preenchidas com fumaça.

Meu sono foi furtado pela obsessão. Meu corpo invadido pela necessidade patriarcal de não perder.
Agora estou parada naquela janela observando os dias escorrendo pela ausência do respeito.


Afinal, onze anos perdendo a individualidade requer um caminho árduo para o reencontro.